quarta-feira, 14 de maio de 2014

Firmando acordos com hiperativos



Firmando acordos com hiperativos
crianças pequenas

Por Marise Jalowitzki


Toda criança voluntariosa, quando bem dirigida na infância, desenvolve capacidades de liderança, com grandes chances de se tornar um empreendedor nato no futuro. Crianças que possuem estas características de iniciativa e inovação e, desde cedo, são podadas em suas iniciativas, acabam ficando ressentidas, revoltadas e confusas.

Uma das queixas mais frequentes de mães que possuem filhotes ‘hiperativos’ é a questão da sua imprevisibilidade, dentre elas, a resistência em ir para a escolinha, as brigas, os gritos. Vitória está passando por esta situação. O menino de 3 anos faz escândalos quase que diariamente, desde a hora de levantar até a hora de sair. Depois, quando está lá, fica super feliz, interage nas atividades e brinca com os coleguinhas. Ele está sob nova intervenção médica, depois de ter recebido risperidona por quase um ano. 

A questão ficou ainda mais pesada com o uso do fármaco e os pais, então, iniciaram um tratamento homeopático e estão sendo assistidos também por uma terapeuta cognitivo-comportamental (que lida com a visão que o pequeno tem do mundo e, também, o insere no meio social , indicando-lhe comportamentos novos, sem traumas).

O pequeno Marcos volta-se especialmente contra a figura paterna que, mais firme, tenta fazer com que ele cumpra os contratos (estabelecidos pelos pais a ele). A mãe teme que o menino possa se sentir abandonado e ficar traumatizado no futuro.

Como ele efetivamente pode ter o chamado ‘atraso de maturidade’ – que é uma média de 3 anos – ele pode, sim, estar raciocinando como um bebê e se sentindo desamparado por ter de ir para a escolinha todos os dias. Essa diferença tende a, naturalmente, se ajustar com o decorrer do tempo (já vimos isso aqui). Poderia haver  uma suspensão temporária da escolinha (uma pediatra que conheço resolveu isso com seu filho há poucas semanas) e ele ficar um tempo a mais em casa, antes de voltar a frequentar alguma instituição escolar. É a 4ª vez que Marcos troca de escola. Assim, é bem possível que  já tenha se instaurado um processo que pode influenciar no comportamento dele mais tarde: “Eu não concordo, faço escândalo e me trocam de escola ou, quem sabe, nem preciso ir mais, mesmo!”. A escolinha pode ter acontecido prematuramente na vida de Marcos.  Há profissionais que recomendam: sempre que a estrutura familiar assim o permitir, que a criança seja levada para um estabelecimento externo quando já souber se comunicar (falar). Isso nem sempre é possível, pois onde a mãe trabalha e não tem um parente com quem deixar, muito cedo a criança deixa seu lar para socializar-se 'obrigatoriamente' o que, em um parecer crescente, não é o mais indicado. 

No presente caso, a escola oferece características inclusivas, está aberta a ouvir e estabelecer parcerias. Assim, o recomendável é que ele continue na escola, pois está recebendo tratamento legal e interage com os coleguinhas. O importante é estabelecer novos acordos com ele. Tipo: 2-1, 2-2. Dois dias (2ª e 3ª ) ele vai para a escolinha, um dia ele folga (4ª feira); dois dias (5ª e 6ª) ele vai, dois dias ele folga (sábado e domingo). Em algumas semanas, dá para incluir algum programa “especial” na 4ª feira, tipo: tem um presente pra tia, ou para um coleguinha que ele gosta mais (um desenho, um doce, algum brinquedinho, uma plantinha, um fato novo a contar, uma revistinha interessante). “A gente passa lá e entrega pra ele!” – ele pode ou não concordar. Indo, pode ou não querer ficar mais por lá. Depois, próximo semestre, incorpora o tempo integral.



Firmando Acordos

Os “acordos, os “contratos” precisam ser firmados entre as duas partes – Mãe e filho devem se manifestar! Quando a criança é pequena e ainda não sabe escrever, uma maneira de fazê-lo entender é:

1º) A mãe falar pouco, firme e objetivamente. Tipo: “Marcos está crescendo! Está cada dia mais bonito e forte! Tem muitos amigos e eles gostam de brincar com o Marcos. E tem coisas importantes, também, pra aprender todos os dias.” O importante é ele saber que todas as crianças vão para lugares, todos os dias, para aprender coisas novas e que isso é bom.

2º) Sempre que acontecer um “item do contrato”, ele deve repetir a frase “cláusula”. Tipo: “Nós vamos fazer um acordo porque é bom pra todos!” – “Acordos são bons!” – “Acordos podem deixar a vida ainda melhor!”.



3º) Colar-pendurar uma folha grande na parede do quartinho dele, com quadrados de cores diferentes, um quadrado para cada dia da semana, bem visível (não padronizar cores, deixar tudo aleatório. Usar as 7 cores do arco-íris). Ele cola uma figura a cada dia, antes de ir para a escola, em um dos quadrados (tipo: um gurizinho com a mochila, sorrindo), representando que está cumprindo o tratado. Na volta, a mãe cola uma estrelinha, ou um sorriso, representando a satisfação de ele ter ido (independente se foi gritando ou não!). Cataventos também podem ser usados como "calendário".

) Criar expectativas animadoras para os dias em que ele reluta mais. Pode ser um desenho que ele fez e que “é bem legal se levar para a tia ver”. Pode ser levar uma plantinha que ele plantou em um vaso. Quando uma das plantinhas nascer, pode ser outro movimento de levar e mostrar (pode deixar na escola, pois a plantinha gosta muito da escolinha, só que, daí, “ele tem de ir lá pra dar aguinha, já que ela precisa de comidinha e ele é o cuidador.” Enfim, criar motivações para o movimento de sair de casa.


A amiga Grace e seu filhote fizeram bolachas para levar às tias e coleguinhas nesta 4ª feira!


5º) Sempre elogiar quando fizer algo que é esperado pelo mundo adulto. O reforço à auto estima é imperioso, para que ele se sinta reconhecido nas atitudes e atividades que fizer legal.

6º) Como é ultra sensível, cada repreensão ou desagrado que receber vai ter um peso extra. Importante apontar, mas sem prolongar (para não virar “sermão”). E, logo que der, tornar a salientar as qualidades e habilidades, “encostando” a ressalva positiva, o elogio.

A mãe relata também que: “Ele chora e faz escândalo todo dia pra ir na escolinha, depois ele fica maravilhosamente bem. Na semana passada fiquei sem carro 3 dias, e como é pertinho , levei ele de ônibus..ele foi super feliz, não fez escândalo, nada...foi todo contente..falava que estava indo de buzão, e até recusou uma carona de uma vizinha de carro, ele queria mesmo ir de buzão. Mas o problema é fazer ele ir todos os dias. Ele acorda e já fala que não quer ir na escolinha, que quer ficar comigo, e qd eu falo que tenho que sair, ele fala então que vai junto comigo. Eu não me sinto culpada por ele fazer escândalo pra ir, mas é preocupante, pois ele solta do cinto e quer ir pra cima do meu marido que esta dirigindo, hj quase que ele bateu o carro.”

Ciúme e Posse

Com relação ao pai, sim, está estabelecido um “racha” bem ao estilo do mundo masculino: “Vamos ver quem pode mais, aqui!”. Ele já percebeu que o pai é mais durão e que ele (filho), com choro e grito, muitas vezes consegue com a mãe o que quer. Com todas as crianças acontece assim. Necessário não permitir que essas cenas se sucedam amiúde, pois o pai pode perder o controle e bater (nele!), o que não é recomendável (mas humano!). O pai pode gritar, encolerizar-se por mais da conta, o que só deixa o ambiente mais tenso. E, lá no instinto primata que todos temos, existe, sim, um ciumão entre o pequeno Marcos e o pai. Os dois querem a mãe e, nos primeiros anos, a mãe tem de saber que representa a expectativa amorosa total na existência do filho. Só com o passar dos anos é que a “classe” de Amor irá clarear dentro da mente e do coração dele: o Amor que une pai e mãe é de um tipo; o Amor que une mãe e filho, doutro. Vem com o tempo.

Tipo de Transporte

No “Painel de Acordos”, no quarto dele, podem ser incluídos dias em que vai de bus, dias que vai de carro (sinalizar isto, previamente, no painel – colar um carrinho, colar um ônibus) e, num cantinho, colocar um desenho de chuva ou um guarda-chuva, contratando que, sempre que chover, irão de carro.
Enfim, são muitas as questões favoráveis que podem ser sugeridas. Fundamental que a mãe enfatize a necessidade de ele respeitar o pai, que o pai gosta do filho, que ele trabalha bastante, que proporciona muitas coisas para o lar. E evitar os confrontos.


Não Rir

Vitória relata também que, por vezes, a cena chega a ser hilária. E é, pois a diferença entre o pequeno voluntarioso, contrapondo-se a um pai (ser humano adulto, responsável e compromissado), não tem comparativo lógico. Mas, mesmo que pareça ridículo o que está acontecendo, mesmo que pareça (e é!) cômico, não dá pra rir, pois isto confunde o pequeno. Ele está brabo, ele está confuso, está numa disputa, está se “defendendo!”, mesmo que seja ele a estar atacando (como no caso de se soltar do cinto e se jogar sobre o pai), mas isso tem de passar apenas por um “Não faz isso! Não faz assim!” firme, sem condenação, mas, também, sem dar chance para alterações.

A mãe sentar por uns tempos no banco de trás não é perda de autoridade

A mãe sentar no banco de trás, por uns dias, com ele, não é quebra de autoridade. “Vou sentar alguns dias contigo, aqui atrás, até que aprendas a te comportar, pois se soltar o cinto, é perigoso e não podemos consentir nisso! Menino que sabe se comportar tem o direito de se sentar sozinho no banco, só com o cinto!” – Aí, como se estivesse apenas comentando com o pai: “- Mas, como o Marcos ainda não aprendeu, vou sentar com ele até que ele seja responsável o suficiente para poder ficar de novo sozinho no seu banco. E as pessoas que vão passar nos carros ao nosso lado, daí, vão ver um Marcos grandinho, homenzinho, responsável, sentado em segurança e vão dizer: ‘Olha ali um menino que cuida de sua segurança! Olha que legal!” Vamos ver em quanto tempo o Marcos vai conseguir isto.” A alteração (o fato da mãe se sentar atrás) não será vista como um prêmio, uma “vitória sobre o pai” e, sim, apenas uma incompetência temporal dele (filho).

A vida está plena de compromissos e cláusulas. Mesmo que não se concorde com todo esse engessamento social é preciso ensinar aos pequenos a melhor forma de cumprir o instituído-necessário. Proporcionar o encontro com as satisfações dentro de um contexto não desejado pela criança é auxiliá-la na resiliência (capacidade para lidar e superar conflitos), fator imprescindível para viver bem, afastando, inclusive, males como sensação de fracasso, diminuição da auto estima, stress e até depressão. Coisa que acomete cada vez mais as crianças de hoje, especialmente por não verem perspectivas de uma vida mais plena.

Continuar acompanhando as atividades na escola

E, por fim, os pais precisam continuar observando, com toda a atenção e cuidado:
- o que é apresentado para os pequenos na escolinha; 
- acompanhar o que a criança produz lá; 
- como é utilizado o tempo; 
- como acontecem as tarefas; 
- quais são as atividades mais práticas e qual a frequência delas. 
- E como os ‘hiperativos’ são conduzidos neste processo.

“Infelizmente, muitas vezes o tratamento dado a essa criança se resume a professora ficar em pé nas atividades em grupo, segurando a criancinha problema pela mão, impedindo que ela participe das atividades físicas, impedindo que ela dê trabalho, impedindo que ela prejudique as atividades dos outros, quando deveria ser justamente nas atividades de maior movimento, onde gastaria sua energia, que ela encontraria as maiores chances de se inserir e aprender a compartilhar. Vira assim, uma mera expectadora das atividades dos coleguinhas, onde amaria e deveria participar.” (Livro TDAH Crianças que Desafiam - Cap. 14 – A melhor escola para seu filho - pág 189 e 190)

Eu mesma assisti a cenas assim, os pequenos pulando no mesmo lugar e, ao final, sucumbindo em silencioso ressentimento. 

E mais, como se trata de crianças muito sensíveis, é importante observar, também, como é que os coleguinhas estão lidando com os possíveis erros de linguagem, os erros e acertos nas atividades, para ver se ele não está sofrendo de bullying. Isso acontece, sim, nesta tenra idade! Risos, gozações. 

Educadores precisam estar atentos para inibir, desde cedo, esta deplorável prática, que tanto mal causa à auto estima!




Enfim, estamos todos, o tempo todo, aprendendo. Buscar informações é fundamental, tentar acertar, uma aposta. E, sempre, sempre, muito Amor, Firmeza e Constância de Propósito.


Um grande abraço!

(Nomes e eventuais locais citados neste artigo, são fictícios)


ACORDOS COM ADOLESCENTES: 
Livro TDAH Crianças que Desafiam
Mudando os hábitos da família (pág. 173 a 176)
Cap 05 - Adolescência, agressividade e mentiras (pág 78 a 93)
Algumas estratégias para ajudar a si mesmo e evitar problemas 
Algumas estratégias para os que convivem com um 'super sincero', tentando diminuir problemas



Artigo publicado também em: http://www.revistaecologica.com/firmando-acordos-com-hiperativos/


Marise Jalowitzki
Compromisso Consciente



Escritora, Educadora, 
Idealizadora e Coordenadora do Curso Formação para Coordenadores em Jogos e Vivências para Dinâmica de Grupos,
Especialista em Gestão de Recursos Humanos pela FGV,
Facilitadora de Grupos em Desenvolvimento Humano,
Ambientalista de coração, Vegana.
Certificada como International Speaker pelo IFTDO-VA-USA
marisejalowitzki@gmail.com 
compromissoconsciente@gmail.com 




Livro TDAH Crianças que desafiam 

Como Lidar com o Déficit de Atenção e a Hiperatividade na Escola e na Família
Contra o uso indiscriminado de metilfenidato - Ritalina, Ritalina LA, Concerta


TDAH Crianças que Desafiam - Marise Jalowitzki




http://tdahcriancasquedesafiam.blogspot.com.br/


Frete free para todo Brasil
Para adquirir direto com a autora 
marisejalowitzki@gmail.com  




2 comentários:

  1. Boa noite! Todas as pessoas que não conhecem ou nunca tiveram que conviver com uma criança com TDAH acha um absurdo ter que medicar uma criança, eu fui contra medicar meu filho por um ano quando ele tinha 5 anos de idade, hoje com 8 anos e desde os 6 anos toma VENVANSE para poder ter um aprendizado da na escola, faz natação e judô para poder estravasar, tem sessões com psicóloga a cada 15 dias e rezamos o terço todos os dias às 18:00 horas, porque acredito que sem Deus em nossa vida não conseguimos aceitar certas coisas que nos são impostas por Ele, porque qual mãe de filho com TDAH nunca se perguntou - porque comigo? - o que fiz de errado para meu filho ter nascido assim? - mas como ninguém tem resposta para nossas perguntas, vamos seguir com nossas vidas e de nossos filhos e maridos cada um com suas dificuldades, lançando mão do que nos aparece para que nossos filhos possam ser pessoas de bom caráter no futuro e suportando pessoas estranhas falarem que nossos filhos não recebem educação em casa, por isso são assim . . . e vamo que vamo.

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  2. Edilma,não se sinta atingida se o caso de teu filhote se enquadra nos 3% que as entidades internacionais reconhecem como casos procedentes e que necessitam de medicação. Estes textos e todo o trabalho envidado é contra O EXCESSIVO número de diagnósticos, que hoje já abarca 11% da população infanto-juvenil) e a indiscriminada medicalização! Isso é um fato que pode ser comprovado todos os dias, onde 10min de consulta, uma receita e nenhum outro acompanhamento resume todo o "diagnóstico" e "tratamento". Sei da angústia que os pais enfrentam e tive isso dentro de minha família! Não existe "culpa", existe despreparo e, sim, muitas vezes, intolerância e impaciência, especialmente na escola. Nossas situações familiares foram possíveis de levar sem a medicação tarja preta. Apelamos para a homeopatia com excelentes resultados, além das outras atividades também citadas por ti. Torço pra que a família de vocês continue bem, sem sobressaltos.

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