sexta-feira, 16 de maio de 2014

O Triângulo Dramático nas Relações Familiares

Qualquer semelhança não é mera coincidência! Temos, sim, compromisso com a realidade!
(Foto Der Spiegel)


O Triângulo Dramático nas Relações Familiares


Por Marise Jalowitzki

É comum encontrar mães que, após alguns anos convivendo com um 'filho-problema', estejam cansadas, confusas, 'pedindo água', ora com muita raiva do filho, dali um pouco, muita pena. Começam acusando a criança, dali um pouco, ao ouvir uma opinião aberta, defendem tenazmente o pequeno, contradizendo tudo o que haviam afirmado há pouco. José Ângelo Gaiarsa, psiquiatra brasileiro (já falecido) repetia sempre que as relações familiares podem facilmente tornar-se o hospício particular para cada membro de uma família. Ora é um que acusa (algoz), o outro se sente agredido (vítima), um terceiro entra para defender (salvador). Dali um pouco os papéis se invertem! Como a vida, nestes núcleos desorganizados, são de franco conflito, os sentimentos experimentados, também o são.

A convivência em lares onde um (ou mais) integrantes apresentam disparidade de gostos e comportamentos, pode se tornar espinhosa. O elemento familiar "desadaptado", geralmente uma criança ou jovem, pode já ter um rótulo como portador de algum "transtorno", o que só deixa as coisas piores, pois o estigma agrava a severidade com que tudo é julgado. Pode estar 'somente' sendo tratado como 'teimoso','irreverente' ou 'desorganizado'. A verdade é que o cotidiano se torna mais um campo de guerra do que um ambiente de harmônica convivência.

Antigamente as pessoas diziam: "Ele é a ovelha negra da família! Quem não tem a sua?"
Hoje a coisa simplificou: "Ele é tdah!"
Ou, para os que ainda não incorporaram o termo: "Ele é retardado!" - "Louco!" - "Maluco!"
Essas crianças ou adolescentes, assim rotulados, acabam reforçando tais conceitos, seja por incapacidade de mudar, seja para chocar, seja pra se auto promover. Também para se auto depreciar e até auto flagelar (quando se machucam, se ferem se mutilam), o que é sempre uma forma de, quando descobertos, chamar a atenção. Como não recebem no lar a atenção carinhosa de que todos os seres necessitam, muitos resolvem retalhar uma parte do corpo; escondem isso das famílias, mas postam nas redes sociais ou em videos para o colegas. Encontram, no choque, uma certa compensação. Triste, mas real. Flavio Gikovate, psicoterapeuta e escritor brasileiro, comenta que a auto depreciação tem sempre o objetivo de chamar a atenção sobre si.

Seja em palavras, gestos ou hábitos, a verdade é que, quanto mais tempo a pessoa e o seu círculo social vivenciam este estado desarmônico, mais difícil fica sair dele. É como se todos se 'acostumassem' ao mal estar reinante. Desentendimentos, brigas, desconforto. Reclamam, são infelizes, mas não mudam. Não tomam providências. Não buscam soluções efetivas. Aquele que é considerado o gerador do desequilíbrio (dos demais e dele próprio), aceita este papel de elemento-problema e encontra nesta forma um jeito de provar a si mesmo que tem algum valor, faz diferença! Ao mesmo tempo em que é um pedido de socorro, é também uma maneira de mostrar que tem vontades. O que não deixa de ser um exercício de poder sobre os demais. Complicado e verdadeiro.







Na tentativa de procurar entender, na tentativa de melhorar a situação, os demais integrantes do grupo (geralmente a família) acabam nem sabendo como agir com naturalidade frente a fatos corriqueiros. Assim, se um dos filhos vai bem na escola, os pais não sabem se podem ou devem elogiá-lo, pois não querem magoar o filho 'problema' que não se saiu tão bem. Abster-se de comemorar, de viver dias mais leves, por achar que, assim, está sendo empático com a dificuldade do outro, pode parecer um motivo nobre, de compaixão. Mas, nos 'certinhos' acaba acumulando mágoas e ressentimentos por não serem reconhecidos. E, no  'problema', a noção de que ele é 'um errado', 'O erro!' só fica cada vez mais forte! E, dali um tempo, aqueles que foram as figuras compreensivas, que julgavam estar fazendo 'o certo', sentem-se logrados, questionam se valeu a pena e podem chegar até a ter sentimentos de revanche e-ou vingança.

O triângulo dramático de Karpman baseia-se em três papéis específicos, que são: Algoz, Vítima, Salvador e se estabelece facilmente em várias situações, como por exemplo em discussões sobre tarefas básicas não executadas por um dos membros. Cada participante pode saltar rapidamente de um a outro papel, repetindo-se nos desempenhos, em ciclos intermináveis e por vezes patológicos de convivência pouco ou nada construtiva. 

Triângulo 1:
Algoz = a filha mais nova agride a mãe (com palavras ou atos) - "Tu não passa de uma chata e eu não te aguento mais! Eu quero sair desta casa!"

Salvador = a filha primogênita defende a mãe "Porque tu tá falando desse jeito de novo? Porque continua fazendo isso? Porque não faz o que ela pede?"

Vítima = a mãe chora; não sabe mais o que fazer ; alguns momentos depois, se levanta, irritada e xinga exasperada a filha mais nova. "Pois quem não te aguenta mais sou eu! Acho que te trocaram na maternidade! Tu não pode ser minha filha! Não é possível!"

 A situação pode se inverter e temos um novo triângulo.

Triângulo 2:
Vítima – a jovem fica bastante chocada com o que ouve, chora copiosamente e diz: “Melhor se eu não tivesse nascido, mesmo! Não queria nunca ter nascido!”

Salvador – a irmã mais velha vê o desespero da irmã e diz: “Pô, pega leve, mãe! Assim ta demais!”

Algoz – A mãe, de vítima inicial, passou a algoz. 

Alguns instantes após, a mãe, chocada com o que acaba de ouvir da primogênita  (de quem continuava a esperar apoio), se exalta e diz: “Tu também vai ficar contra mim? Vai defender ela agora? Tá querendo te igualar a ela? Santa paciência! Pois que vão as duas!” 

As duas irmãs se entreolham, até podem se abraçar (Vítima e Salvador se unem).

Aparece um novo triângulo.

Triângulo 3:
Vítima – Após um certo tempo, a mãe, que há pouco agrediu, cai em prostração, em profundo desânimo e começa novamente a chorar.

Salvador – A filha mais nova, vendo aquilo tudo, tenta dizer alguma coisa para consolar a mãe, tentar salvar a situação. Promete que vai mudar.

Algoz – a filha primogênita, que antes era salvadora da irmã, passa a ser algoz. “Também não sei porque ainda me meto nestas furadas! Praga de vida! Droga de família!” – sai batendo a porta ou pode cair em prostração e, aí, pode iniciar um novo ciclo.

Rodízio que parece não ter fim! Só acaba quando uma das três partes resolve romper com o triângulo dramático, o que dificilmente se consegue sozinho(a). Tem de haver o acompanhamento de um terapeuta.

Por isso, por mais que muitas mães ainda relutem, acreditando que vão conseguir resolver a situação em um certo momento mágico (que não chega nunca!), o acompanhamento terapêutico pode ajudar muito. E ir se informando e implementando mudanças positivas dentro do lar.

A pior das situações é colocar toda a responsabilidade em uma pessoa só (geralmente a criança). É peso demais, é injusto! E, cruel, querer apenas colocar uma pílula na garganta do pequeno e esperar que tudo fique OK! Vida é bem mais do que isto! Criar filhos nunca foi fácil! Mas a responsabilidade por esta condução é dos adultos!

Arregaçar as mangas e tentar acertar!


Marise Jalowitzki
Compromisso Consciente



Escritora, Educadora, 
Idealizadora e Coordenadora do Curso Formação para Coordenadores em Jogos e Vivências para Dinâmica de Grupos,
Especialista em Gestão de Recursos Humanos pela FGV,
Facilitadora de Grupos em Desenvolvimento Humano,
Ambientalista de coração, Vegana.
Certificada como International Speaker pelo IFTDO-VA-USA
marisejalowitzki@gmail.com 
compromissoconsciente@gmail.com 




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